sexta-feira, 26 de abril de 2013

SESSÃO COMEMORATIVA DO 25 DE ABRIL NA ASSEMBLEIA MUNICIPAL

Fernando Pita

Na sessão comemorativa do 25 de abril na Assembleia Municipal, os camaradas Fernando Pita, enquanto Presidente da Assembleia Municipal e Nuno Redinha em representação da bancada do Partido Socialista usaram da palavra, e aqui no blog transcrevemos os seus discursos. Hoje o do Presidente da Assembleia e amanhã o do deputado Nuno Redinha.

Exma. Senhora Vice-Presidente da Câmara Municipal,
Senhores Vereadores da Câmara Municipal,
Senhores Deputados da Assembleia Municipal,
Senhores Presidentes de Junta,
Minhas Senhoras e meus Senhores;

Nesta sessão solene comemoramos os 39 anos da Revolução de 25 de Abril de 1974, que levou ao derrube da ditadura, numa situação de grave crise económica, financeira e social. 

Apesar deste momento difícil devemos honrar e homenagear todos os que lutaram e realizaram o 25 de Abril, feito heróico e memorável, que ficará marcado para sempre na extensa e rica história de Portugal. Revolução de Abril que pôs fim a uma guerra colonial devastadora que durou 13 anos e causou cerca de 10.000 mortos e aproximadamente 100.000 feridos, pôs fim à opressão, pôs fim à prisão apenas por delito de opinião e pôs fim ao isolamento internacional de Portugal. Permitiu que os portugueses vivessem em Paz e em Liberdade.

Mais de metade da população portuguesa nasceu depois de Abril de 1974, por isso para a maioria dos portugueses é quase impossível imaginar como era Portugal antes daquela data. É difícil imaginar como era viver num regime de medo, de ignorância, sem liberdade de expressão, sem grandes perspectivas, onde os jovens tinham apenas como única certeza a mobilização para a guerra. É difícil imaginar um país onde as condições de vida eram mínimas, para não dizer miseráveis, onde a maioria da população vivia na pobreza, as infraestruturas básicas não existiam, as estradas eram poucas e más, muitas aldeias estavam privadas de acessos rodoviários, cerca de 35% das casas não tinham energia eléctrica e quase 60% não tinham água. A generalidade das famílias não tinha bens que hoje consideramos imprescindíveis e sem os quais não sabemos viver. Ter carro ou mesmo alguns electrodomésticos, como televisão, era uma miragem. Poucos eram os jovens que depois de concluir a escola primária continuavam os estudos, resultado dos poucos recursos económicos dos seus pais, sendo obrigados a trabalhar logo aos 13-14 anos.

Embora hoje muitos ponham em causa a revolução de Abril, ponham em causa a Democracia, digam que o 25 de Abril está por cumprir, devemos reconhecer o muito que foi feito ao longo destes 39 anos. Com a Revolução de Abril permitiu-se o acesso de milhões de pessoas aos sistemas de protecção social; criou-se um moderno Serviço Nacional de Saúde; criou-se um moderno sistema na Educação. Construí-se uma vasta rede de infra-estruturas como Rede de estradas, de abastecimento de água e de saneamento básico. A esperança de vida antes do 25 de Abril era de 68 anos; agora é de 79 anos. O número de Médicos por 100 mil habitantes antes do 25 de Abril era de 122 em 2011 era de 405. A mortalidade infantil antes do 25 de Abril era de 37,9 crianças por mil nascimentos; actualmente é de 3,1 crianças. A taxa de analfabetismo antes do 25 de Abril era de 27%; hoje é de 5%. O número de alunos no ensino secundário em 1974 era de 50.000; em 2011 era de 441.000. Até 1970 o número de portugueses com curso superior era de aproximadamente 50.000 e até 2011 o número de portugueses diplomados era de 1.250.000.

Ao longo destes 40 anos formaram-se 25 vezes mais portugueses do que até 1970. Também é verdade que nas condições em que o país está podemos perguntar para que é que o país anda a formar tantos jovens, pois entretanto esqueceu-se de criar as condições para que haja empresas que os empreguem, e por isso esta nova geração, com formação como nenhuma outra, vai ser obrigada a emigrar.

Também o Poder Local foi uma das grandes conquistas do 25 de Abril de 1974, tendo desempenhado um papel fundamental nestes 39 anos de Democracia, pois a enorme melhoria das condições de vida dos portugueses também se deve à acção do Poder Local. Infelizmente como dizia à um ano nesta sala e apesar do desenvolvimento operado nas últimas décadas, mais uma vez celebramos o 25 de Abril numa época de crise, que tragicamente se tem acentuado e que, como sempre, atinge sobretudo de forma impiedosa e por vezes dramática os mais pobres e desprotegidos. Os trabalhadores, os desempregados, os trabalhadores precários, vivem num clima de insegurança e de medo pelo seu futuro.

Há quem diga que este é o pior período da história de Portugal pós 25 de Abril. Resultado da enorme e incontrolável divida e défice do Estado, da dívida das famílias e das empresas, da constante diminuição da riqueza nacional (PIB), do aumento galopante de falência de empresas e do aumento dramático do número de desempregados, que hoje constitui o principal flagelo nacional, pois atinge cerca de 930.000 portugueses, 18.5% da população activa, não considerando os cerca de 200 mil portugueses fora do activo e que não são identificados como desempregados.

Questionamo-nos porque chegámos a esta situação, se calhar há muitas causas, porém governações incompetentes passadas e presentes, ruinosas gestões de empresas públicas, com destruição de muitos milhares de milhões de euros, são com certeza algumas delas, sem que os seus responsáveis milionariamente pagos, sejam punidos. Muitas vezes a punição para estes gestores ruinosos é saltarem de empresa em empresa ou passarem do sector empresarial público para grandes empresas privadas. Se até há dois anos atrás, as razões invocadas para a crise eram o excessivo despesismo do estado, das empresas e das famílias, recentemente brutais medidas de austeridade têm agravado ainda mais a crise, observando-se o estrangulamento da economia nacional. 

Pior do que a actual crise é não vislumbrarmos sinais de esperança, não só em Portugal mas também na Europa. Apesar dos cortes na despesa do Estado, com o objectivo de diminuir a dívida e o défice orçamental, observamos exactamente o contrário e assim não conseguimos cumprir nenhuma meta assumida no programa de ajustamento com a Troika. Assistimos a uma espiral de recessão, que não pára de aumentar. Se em 2010 o PIB cresceu 1.9% face ao ano anterior já em 2011 diminuiu 1.6% e em 2012 diminuiu 3.2%. Últimas previsões do FMI para o presente ano, embora estimem um crescimento da economia mundial da ordem dos 3%, prevêem um decréscimo para a zona Euro de 0.3% e uma quebra para Portugal de 2.6%. Isto significa que a recessão veio para ficar e que o país vai continuar a empobrecer. Recentemente soubemos que a economia portuguesa foi considerada a 4ª pior do mundo, nunca atingimos lugar tão indesejado. 

Porque também a dívida contraída não pára de aumentar, Portugal começa a ficar numa posição trágica. Se em 2011 a dívida era de 108% do PIB, em 2012 passou para 122.5% e actualmente já é de 126% do PIB, cerca de 209 mil milhões de euros. Em face destes valores, para conseguirmos pagar a dívida nos próximos 30 anos, a nossa economia teria de crescer 5% ao ano acima da inflação. Podemos afirmar que estamos perante uma divida impagável. Com o rumo trilhado assistimos nestes dois últimos anos à destruição de 7% da nossa riqueza, assistimos à destruição do país, não apenas no presente, mas também para as próximas gerações. É triste verificar que para além de construímos um país que não dá oportunidade aos seus Jovens pois cerca de 40% deles estão no desemprego, é-lhes transferida uma dívida que também não vão conseguir pagar. 

Apesar do país estar a ser destruído, o governo, a mando da Troika, ao longo destes dois anos de governação, ao contrário da posição dos partidos da oposição e da esmagadora maioria dos especialistas na área da economia e gestão, tem apenas insistido no caminho da austeridade, não apostando em paralelo em iniciativas que dinamizem a economia. Já verificámos que assim não vamos chegar a ponto nenhum, pois austeridade aplicada num clima de recessão só pode conduzir a maus resultados, só pode conduzir a mais recessão, a mais falências, a mais desemprego, a menos receita fiscal, a mais divida e a mais défice. 

Felizmente antes de ontem soubemos que o Governo, depois de ao longo de meses recusar as propostas da sociedade civil e dos partidos da oposição no sentido de implementar medidas de dinamização da economia, aprovou um memorando de crescimento e desenvolvimento para o país, algo ainda difuso, mas que passará pela criação de um banco de fomento e linhas de crédito para financiamento de pequenas e médias empresas e a diminuição progressiva do IRC. É caso para dizer que mais vale tarde do que nunca, pois o governo cegamente tem apostado apenas nos cortes duros e cegos. 

Apesar do governo até hoje ter sido tão austero junto dos trabalhadores, dos reformados, junto dos mais fracos, e apesar do definhar da economia, da agonia das empresas, só agora passados meses após a recapitalização da banca com milhares de milhões de euros é que vem pressionar esta mesma banca para criar condições favoráveis ao financiamento das empresas. Perguntamos qual o ponto de situação das prometidas renegociações dos contratos das PPP e das famosas rendas no sector energético, que tantos milhões têm custado ao erário público. Agora fala-se na possibilidade de se aplicar uma taxa especial sobre aquelas parcerias, quando há um ano se dizia que isso era impossível. Alguém nos anda a iludir.

Assim, ao contrário da austeridade para com os trabalhadores traduzida no imediato aumento de impostos e cortes nos subsídios de férias e de Natal, observamos que aqueles contratos continuam intocáveis, permitindo às empresas arrecadarem muitos milhões de euros de lucro. É caso para dizer temos um governo de duas faces, temos um governo austero, exigente e forte para com os fracos e mais desprotegidos e temos um governo submisso e fraco para com os fortes e os poderosos.

Até há dois anos atrás os actuais governantes apelidavam o anterior governo de incompetente, argumentavam que os males nacionais eram da sua exclusiva responsabilidade, sendo insignificante o efeito da crise Mundial. Passados dois anos os actuais governantes, anteriormente na oposição, dizem exactamente o contrário, que o actual estado do país é consequência quase exclusiva da crise mundial, da crise europeia, para não falar da fadada responsabilidade atribuída ao anterior governo, que com certeza também tem alguma. Nada é da sua responsabilidade, pois estão a fazer exactamente o que o professor, isto é, a Troika manda, austeridade, austeridade, cortes e mais cortes. Como muda o discurso dos políticos consoante as suas conveniências, consoante se está no governo ou se está na oposição. Depois queixam-se do desinteresse dos portugueses em relação à política e da perda de confiança nos políticos. Esta desconfiança este descrédito reflecte-se no aumento da abstenção nas eleições. Nas eleições para a Assembleia da República em 1975 a abstenção foi de 8.3%, em 1985 a abstenção foi de 24.6%, em 1995 foi 32.9% e em 2011 a abstenção foi de 41.1%.

O afastamento da população de um acto de cidadania tão importante como são as eleições devia levar a classe política a ter um comportamento de estado, a repensar a sua acção, a falarem verdade a não serem demagogos, a defender apenas o interesse da população, do país, e quando no poder executassem o prometido. Este governo para além da sua incompetência, tem ainda outras facetas, como a da arrogância, insensibilidade e teimosia, aliás característica tantas vezes criticada, se calhar com razão, no anterior 1º ministro. Este comportamento é ilustrado pela feitura, pelo 2º ano consecutivo, de um orçamento inconstitucional e é ilustrado pelo discurso do 1º ministro e pelo despacho do ministro das finanças em resultado da decisão do Tribunal Constitucional sobre a inconstitucionalidade de 4 normas do orçamento de estado.

No seu discurso irritado, o 1º Ministro para além de dizer que não concordava com a decisão do T.C., opinião legitima, pôs em causa o patriotismo da decisão, afrontou o T.C., dramatizou a situação, num tom ditatorial ameaçou os portugueses que com aquela decisão eles ainda iriam sofrer mais e responsabilizou a decisão do T.C. pelo futuro incumprimento das metas constantes no programa de ajustamento. Se ao fim de quase dois anos este governo não foi capaz de cumprir uma meta, um objectivo, com deslizes enormes relativamente ao previsto, como pôde invocar a decisão do T.C. para justificar futuros falhanços, pois até aqui tem falhado em toda a linha. É preciso ter descaramento. Em face da decisão do T.C., o governo propõe em primeiro lugar fazer cortes no sector da saúde, das prestações sociais e da educação, como o subsídio de desemprego e subsídio por doença, o que traduz a sua insensibilidade para o drama do desemprego, para com os mais desprotegidos.

O governo diz agora que para a credibilização de Portugal no exterior e para o sucesso das sucessivas avaliações dos nossos credores é necessário um consenso nacional, um consenso político e social, que as reformas a fazer devem ser conseguidas à mesa da concertação social. Porém, ao longo dos últimos meses tem marginalizado os parceiros sociais e todos os partidos da oposição, em particular o Partido Socialista, pois apenas tem negociado com a Troika e depois limita-se a comunicar as medidas recessivas aos portugueses. Por outro lado o governo ainda não entendeu que está completamente isolado e que já há um consenso nacional, consenso contra o rumo seguido, pois chegados aqui constatamos que estamos muito pior do que há dois anos atrás.

Passados 39 da revolução de Abril, muitos afirmam que é necessário um novo 25 de Abril, pois a pobreza extrema, a fome, o desequilíbrio na distribuição da riqueza, a perda de garantias básicas na saúde e educação, o enorme desemprego, algumas das razões que levaram à realização do 25 de Abril, hoje são uma ameaça real. Apesar disto, não me parece que seja necessário um novo 25 de Abril igual ao de 1974, com armas na rua.

Precisamos sim de políticas que promovam uma economia ao serviço da sociedade. Precisamos de verdadeiros líderes, verdadeiros Estadista, de pessoas que por este ou aquele motivo, se afastaram da cena política e deixaram campo aberto para estes e outros senhores. Precisamos de um Estado austero e rigoroso, mas justo que não faça cortes cegos, que por si só apenas fomentam o desemprego, que para além de austero também promova medidas de investimento que dinamize a economia e o emprego. Precisamos que seja a política a liderar os destinos do país e da Europa e não as grandes empresas, os grandes interesses financeiros, os mercados, instituições não eleitas democraticamente e que não zelam pelo bem comum. Precisamos de uma sociedade mais igualitária, precisamos de uma mais justa distribuição dos recursos, pois apesar de nunca ter havido tantos meios, tanta capacidade de produção, tantos recursos tecnológicos e humanos qualificados, assistimos a uma enorme desigualdade na distribuição de riqueza, assistimos ao agravamento da pobreza e ao abandono das pessoas.

Hoje mais do que nunca precisamos do espírito do 25 de Abril, dos objectivos, do simbolismo, da seriedade, da honradez, da ética, dos valores que estiveram presentes naquela Revolução e que se foram perdendo ao longo do tempo. 

Fernando Pita
Presidente da Assembleia Municipal de Condeixa-a-Nova


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