Fernando Pita |
Na sessão comemorativa do 25 de abril na Assembleia Municipal, os camaradas Fernando Pita, enquanto Presidente da Assembleia Municipal e Nuno Redinha em representação da bancada do Partido Socialista usaram da palavra, e aqui no blog transcrevemos os seus discursos. Hoje o do Presidente da Assembleia e amanhã o do deputado Nuno Redinha.
Exma. Senhora Vice-Presidente da Câmara Municipal,
Senhores Vereadores da Câmara Municipal,
Senhores Deputados da Assembleia Municipal,
Senhores Presidentes de Junta,
Minhas Senhoras e meus Senhores;
Nesta sessão solene comemoramos os 39 anos da Revolução de 25 de Abril de 1974, que levou ao derrube da ditadura, numa situação de grave crise económica, financeira e social.
Apesar deste
momento difícil devemos honrar e homenagear todos os que lutaram e realizaram o
25 de Abril, feito heróico e memorável, que ficará marcado para sempre na
extensa e rica história de Portugal. Revolução de
Abril que pôs fim a uma guerra colonial devastadora que durou 13 anos e causou
cerca de 10.000 mortos e aproximadamente 100.000 feridos, pôs fim à opressão,
pôs fim à prisão apenas por delito de opinião e pôs fim ao isolamento
internacional de Portugal. Permitiu que os portugueses vivessem em Paz e em
Liberdade.
Mais de metade da população portuguesa
nasceu depois de Abril de 1974, por isso para a maioria dos portugueses é quase
impossível imaginar como era Portugal antes daquela data. É difícil imaginar como era viver num regime de medo, de
ignorância, sem liberdade de expressão, sem grandes perspectivas, onde os
jovens tinham apenas como única certeza a mobilização para a guerra. É difícil
imaginar um país onde as condições de vida eram mínimas, para não dizer
miseráveis, onde a maioria da população vivia na pobreza, as infraestruturas
básicas não existiam, as estradas eram poucas e más, muitas aldeias
estavam privadas de acessos rodoviários, cerca de 35% das casas não tinham energia eléctrica e quase 60%
não tinham água. A generalidade das
famílias não tinha bens que hoje consideramos imprescindíveis e sem os quais
não sabemos viver. Ter carro ou mesmo alguns electrodomésticos, como televisão,
era uma miragem. Poucos eram os
jovens que depois de concluir a escola primária continuavam os estudos,
resultado dos poucos recursos económicos dos seus pais, sendo obrigados a
trabalhar logo aos 13-14 anos.
Embora hoje
muitos ponham em causa a revolução de Abril, ponham em causa a Democracia,
digam que o 25 de Abril está por cumprir, devemos reconhecer o muito que foi feito ao longo destes 39 anos. Com a Revolução
de Abril permitiu-se o acesso de milhões de pessoas aos sistemas de protecção
social; criou-se um moderno Serviço Nacional de Saúde; criou-se um moderno
sistema na Educação. Construí-se uma
vasta rede de infra-estruturas como Rede de estradas, de abastecimento de água
e de saneamento básico. A esperança de vida antes do 25 de Abril
era de 68 anos; agora é de 79 anos. O número de Médicos por 100 mil
habitantes antes do 25 de Abril era de 122 em 2011 era de 405. A mortalidade infantil antes do 25 de
Abril era de 37,9 crianças por mil nascimentos; actualmente é de 3,1 crianças. A taxa de
analfabetismo antes do 25 de Abril era de 27%; hoje é de 5%. O número de alunos no ensino secundário
em 1974 era de 50.000; em 2011 era de 441.000. Até 1970 o
número de portugueses com curso superior era de aproximadamente 50.000 e até
2011 o número de portugueses diplomados era de 1.250.000.
Ao longo destes
40 anos formaram-se 25 vezes mais portugueses do que até 1970. Também é verdade
que nas condições em que o país está podemos perguntar para que é que o país anda a formar tantos jovens, pois
entretanto esqueceu-se de criar as condições para que haja empresas que os
empreguem, e por isso esta nova geração, com formação como nenhuma outra, vai
ser obrigada a emigrar.
Também o Poder
Local foi uma das grandes conquistas do 25 de Abril de 1974, tendo desempenhado
um papel fundamental nestes 39 anos de Democracia, pois a enorme melhoria das
condições de vida dos portugueses também se deve à acção do Poder Local. Infelizmente
como dizia à um ano nesta sala e apesar do desenvolvimento operado nas últimas
décadas, mais uma vez celebramos o 25 de Abril numa época de crise, que
tragicamente se tem acentuado e que, como sempre, atinge sobretudo de forma
impiedosa e por vezes dramática os mais pobres e desprotegidos. Os
trabalhadores, os desempregados, os trabalhadores precários, vivem num clima de
insegurança e de medo pelo seu futuro.
Há quem diga que este é o pior período
da história de Portugal pós 25 de Abril. Resultado da enorme e incontrolável
divida e défice do Estado, da dívida das famílias e das empresas, da constante
diminuição da riqueza nacional (PIB), do aumento galopante de falência de
empresas e do aumento dramático do número de desempregados, que hoje constitui
o principal flagelo nacional, pois atinge cerca de 930.000 portugueses, 18.5%
da população activa, não considerando os cerca de 200 mil portugueses fora do
activo e que não são identificados como desempregados.
Questionamo-nos
porque chegámos a esta situação, se calhar há muitas causas, porém governações
incompetentes passadas e presentes, ruinosas gestões de empresas públicas, com
destruição de muitos milhares de milhões de euros, são com certeza algumas
delas, sem que os seus responsáveis milionariamente pagos, sejam punidos.
Muitas vezes a punição para estes gestores ruinosos é saltarem de empresa em
empresa ou passarem do sector empresarial público para grandes empresas
privadas. Se até há dois
anos atrás, as razões invocadas para a crise eram o excessivo despesismo do
estado, das empresas e das famílias, recentemente brutais medidas de
austeridade têm agravado ainda mais a crise, observando-se o estrangulamento da
economia nacional.
Pior do que a actual crise é não
vislumbrarmos sinais de esperança, não só em Portugal mas também na Europa.
Apesar dos cortes na despesa do Estado, com o objectivo de diminuir a dívida e
o défice orçamental, observamos exactamente o contrário e assim não conseguimos
cumprir nenhuma meta assumida no programa de ajustamento com a Troika.
Assistimos a uma espiral de recessão, que não pára de aumentar. Se em 2010 o
PIB cresceu 1.9% face ao ano anterior já em 2011 diminuiu 1.6% e em 2012
diminuiu 3.2%. Últimas previsões do FMI para o presente ano, embora estimem um
crescimento da economia mundial da ordem dos 3%, prevêem um decréscimo para a
zona Euro de 0.3% e uma quebra para Portugal de 2.6%. Isto significa que a
recessão veio para ficar e que o país vai continuar a empobrecer. Recentemente
soubemos que a economia portuguesa foi considerada a 4ª pior do mundo, nunca
atingimos lugar tão indesejado.
Porque também a dívida contraída não
pára de aumentar, Portugal começa a ficar numa posição trágica. Se em 2011 a
dívida era de 108% do PIB, em 2012 passou para 122.5% e actualmente já é de
126% do PIB, cerca de 209 mil milhões de euros. Em face destes valores, para conseguirmos
pagar a dívida nos próximos 30 anos, a nossa economia teria de crescer 5% ao
ano acima da inflação. Podemos afirmar que estamos perante uma divida
impagável. Com o rumo trilhado assistimos nestes
dois últimos anos à destruição de 7% da nossa riqueza, assistimos à destruição
do país, não apenas no presente, mas também para as próximas gerações. É triste
verificar que para além de construímos um país que não dá oportunidade aos seus
Jovens pois cerca de 40% deles estão no desemprego, é-lhes transferida uma
dívida que também não vão conseguir pagar.
Apesar do país estar a ser destruído, o
governo, a mando da Troika, ao longo destes dois anos de governação, ao
contrário da posição dos partidos da oposição e da esmagadora maioria dos
especialistas na área da economia e gestão, tem apenas insistido no caminho da
austeridade, não apostando em paralelo em iniciativas que dinamizem a economia.
Já verificámos que assim não vamos chegar a ponto nenhum, pois austeridade
aplicada num clima de recessão só pode conduzir a maus resultados, só pode
conduzir a mais recessão, a mais falências, a mais desemprego, a menos receita
fiscal, a mais divida e a mais défice.
Felizmente antes de ontem soubemos que
o Governo, depois de ao longo de meses recusar as propostas da sociedade civil
e dos partidos da oposição no sentido de implementar medidas de dinamização da
economia, aprovou um memorando de crescimento e desenvolvimento para o país,
algo ainda difuso, mas que passará pela criação de um banco de fomento e linhas
de crédito para financiamento de pequenas e médias empresas e a diminuição
progressiva do IRC. É caso para dizer que mais vale tarde do que nunca, pois o
governo cegamente tem apostado apenas nos cortes duros e cegos.
Apesar do governo até hoje ter sido tão
austero junto dos trabalhadores, dos reformados, junto dos mais fracos, e
apesar do definhar da economia, da agonia das empresas, só agora passados meses
após a recapitalização da banca com milhares de milhões de euros é que vem
pressionar esta mesma banca para criar condições favoráveis ao financiamento
das empresas. Perguntamos qual o ponto de situação
das prometidas renegociações dos contratos das PPP e das famosas rendas no
sector energético, que tantos milhões têm custado ao erário público. Agora
fala-se na possibilidade de se aplicar uma taxa especial sobre aquelas
parcerias, quando há um ano se dizia que isso era impossível. Alguém nos anda a
iludir.
Assim, ao contrário da austeridade para
com os trabalhadores traduzida no imediato aumento de impostos e cortes nos
subsídios de férias e de Natal, observamos que aqueles contratos continuam
intocáveis, permitindo às empresas arrecadarem muitos milhões de euros de
lucro. É caso para dizer temos um governo de
duas faces, temos um governo austero, exigente e forte para com os fracos e
mais desprotegidos e temos um governo submisso e fraco para com os fortes e os
poderosos.
Até há dois anos atrás os actuais
governantes apelidavam o anterior governo de incompetente, argumentavam que os
males nacionais eram da sua exclusiva responsabilidade, sendo insignificante o
efeito da crise Mundial. Passados dois anos os actuais governantes,
anteriormente na oposição, dizem exactamente o contrário, que o actual estado
do país é consequência quase exclusiva da crise mundial, da crise europeia,
para não falar da fadada responsabilidade atribuída ao anterior governo, que
com certeza também tem alguma. Nada é da sua responsabilidade, pois estão a
fazer exactamente o que o professor, isto é, a Troika manda, austeridade,
austeridade, cortes e mais cortes. Como muda o discurso dos políticos consoante
as suas conveniências, consoante se está no governo ou se está na oposição.
Depois queixam-se do desinteresse dos portugueses em relação à política e da
perda de confiança nos políticos. Esta desconfiança este descrédito reflecte-se
no aumento da abstenção nas eleições. Nas eleições para a Assembleia da
República em 1975 a abstenção foi de 8.3%, em 1985 a abstenção foi de 24.6%, em
1995 foi 32.9% e em 2011 a abstenção foi de 41.1%.
O afastamento da população de um acto
de cidadania tão importante como são as eleições devia levar a classe política
a ter um comportamento de estado, a repensar a sua acção, a falarem verdade a
não serem demagogos, a defender apenas o interesse da população, do país, e
quando no poder executassem o prometido. Este governo para além da sua
incompetência, tem ainda outras facetas, como a da arrogância, insensibilidade
e teimosia, aliás característica tantas vezes criticada, se calhar com razão,
no anterior 1º ministro. Este comportamento é ilustrado pela feitura, pelo 2º
ano consecutivo, de um orçamento inconstitucional e é ilustrado pelo discurso
do 1º ministro e pelo despacho do ministro das finanças em resultado da decisão
do Tribunal Constitucional sobre a inconstitucionalidade de 4 normas do
orçamento de estado.
No seu discurso irritado, o 1º Ministro
para além de dizer que não concordava com a decisão do T.C., opinião legitima,
pôs em causa o patriotismo da decisão, afrontou o T.C., dramatizou a situação,
num tom ditatorial ameaçou os portugueses que com aquela decisão eles ainda
iriam sofrer mais e responsabilizou a decisão do T.C. pelo futuro incumprimento
das metas constantes no programa de ajustamento. Se ao fim de quase dois anos
este governo não foi capaz de cumprir uma meta, um objectivo, com deslizes
enormes relativamente ao previsto, como pôde invocar a decisão do T.C. para
justificar futuros falhanços, pois até aqui tem falhado em toda a linha. É
preciso ter descaramento. Em face da decisão do T.C., o governo
propõe em primeiro lugar fazer cortes no sector da saúde, das prestações
sociais e da educação, como o subsídio de desemprego e subsídio por doença, o
que traduz a sua insensibilidade para o drama do desemprego, para com os mais
desprotegidos.
O governo diz agora que para a
credibilização de Portugal no exterior e para o sucesso das sucessivas
avaliações dos nossos credores é necessário um consenso nacional, um consenso
político e social, que as reformas a fazer devem ser conseguidas à mesa da concertação
social. Porém, ao longo dos últimos meses tem marginalizado os parceiros
sociais e todos os partidos da oposição, em particular o Partido Socialista,
pois apenas tem negociado com a Troika e depois limita-se a comunicar as
medidas recessivas aos portugueses. Por outro lado o governo ainda não
entendeu que está completamente isolado e que já há um consenso nacional,
consenso contra o rumo seguido, pois chegados aqui constatamos que estamos
muito pior do que há dois anos atrás.
Passados 39 da revolução de Abril,
muitos afirmam que é necessário um novo 25 de Abril, pois a pobreza extrema, a
fome, o desequilíbrio na distribuição da riqueza, a perda de garantias básicas
na saúde e educação, o enorme desemprego, algumas das razões que levaram à
realização do 25 de Abril, hoje são uma ameaça real. Apesar disto, não me
parece que seja necessário um novo 25 de Abril igual ao de 1974, com armas na
rua.
Precisamos sim de políticas que
promovam uma economia ao serviço da sociedade. Precisamos de verdadeiros líderes,
verdadeiros Estadista, de pessoas que por este ou aquele motivo, se afastaram
da cena política e deixaram campo aberto para estes e outros senhores. Precisamos de um Estado austero e
rigoroso, mas justo que não faça cortes cegos, que por si só apenas fomentam o
desemprego, que para além de austero também promova medidas de investimento que
dinamize a economia e o emprego. Precisamos que seja a política a
liderar os destinos do país e da Europa e não as grandes empresas, os grandes
interesses financeiros, os mercados, instituições não eleitas democraticamente
e que não zelam pelo bem comum. Precisamos de uma sociedade mais
igualitária, precisamos de uma mais justa distribuição dos recursos, pois
apesar de nunca ter havido tantos meios, tanta capacidade de produção, tantos
recursos tecnológicos e humanos qualificados, assistimos a uma enorme
desigualdade na distribuição de riqueza, assistimos ao agravamento da pobreza e
ao abandono das pessoas.
Hoje mais do que nunca precisamos do
espírito do 25 de Abril, dos objectivos, do simbolismo, da seriedade, da
honradez, da ética, dos valores que estiveram presentes naquela Revolução e que
se foram perdendo ao longo do tempo.
Fernando Pita
Presidente da Assembleia Municipal de Condeixa-a-Nova
Fernando Pita
Presidente da Assembleia Municipal de Condeixa-a-Nova
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